Morte, celebração e sátira : sentido de humor e crítica social em "O defunto inaugural: relato de um fantasma," de Aníbal Machado

Roč.40,č.2(2019)

Abstrakt
Em literatura, a morte é uma construção, a representação de um conceito abstrato. Num cenário mimético, os mortos são incapazes de falar e, certamente, incapazes de escrever livros. No entanto, vozes defuntas têm sido usadas durante séculos para contar histórias, desde a herança grega dos Diálogos dos Mortos, de Luciano de Samósata (século II d.C.), passando pelas Memórias Póstumas de Brás Cubas, do brasileiro Machado de Assis (1881), até aos nossos dias. Através da lente do fantástico, este artigo analisa o uso da narração póstuma ficcional no conto "O Defunto Inaugural," de Aníbal Machado, que desafia as convenções narrativas de verisimilitude, ao apresentar uma figura impossível de qualificar de acordo com as leis naturais. Questiono o motivo pelo qual uma voz defunta é mais apropriada para contar uma determinada história, e contesto as limitações da definição de fantástico de Tzvetan Todorov, contrapondo-as com a abordagem mais abrangente de Rosemary Jackson ao fantástico enquanto um tipo de literatura capaz de transmitir mais precisamente o estranho sentimento de deslocalização em relação a certos sistemas políticos e sociais. Sublinho o potencial da narração póstuma enquanto meio de pôr a descoberto e debater temas contemporâneos relevantes de identidade pessoal, política e social, pois, enquanto figura transcendente, este defunto tem a autoridade de revelar a verdade e confessar segredos. A morte proporciona uma plataforma segura para contar um lado da história que tinha mantido em silêncio enquanto estava vivo.

Klíčová slova:
narração póstuma; fantástico; Unheimlich; abjeção; morte

Stránky:
49–64
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